Um papo com minha filha

Adriana Nalesso *

Outro dia, conversando com uma das minhas filhas (tenho duas), ela me dizia que vê na imprensa tantas coisas contra a política e os políticos, que não entendia como os trabalhadores e seus sindicatos podiam se envolver com essas questões.


 


Expliquei, então, que também já tive essa dúvida. Pensava que sindicato era só para reivindicar melhores salários e condições de trabalho, e que a política era coisa para os políticos resolverem. Como bancária, comecei a participar das campanhas salariais, das lutas contra as privatizações e da defesa dos lesionados por motivos de trabalho. E, em pouco tempo, compreendi que muitas daquelas situações dependiam de leis que reconheciam, ou não, direitos conquistados, muitas vezes como resultado de lutas mais antigas, como a jornada de seis horas, fruto de uma greve da categoria ocorrida em 1933.


 


A vida do trabalhador ou, no meu caso, trabalhadora, não se resume ao local de trabalho, e a remuneração que nós, bancários, recebemos a cada mês depende muito das vendas que conseguimos ou não fazer. Se os transportes são ruins e caros, por exemplo, gastamos mais dinheiro e tempo, que não estica como elástico, indo e voltando do trabalho. E, consequentemente, ficamos menos tempo com a família, mais cansados, além de sobrar menos grana para outras coisas. Influir aí na questão da mobilidade urbana passa a ser uma necessidade. E assim é com outras políticas públicas, como saúde, educação, cultura e tantas outras situações que nos atingem diretamente.


 


Como mudar isso?


 


Minha filha acrescentou ainda as condições ambientais e comentou sobre a recente aprovação do marco civil da internet, assuntos que ela vem acompanhando com maior interesse. E retomou a questão inicial: “Por que a imprensa dá tantas notícias ruins sobre a política e os políticos? Como se pode mudar isso?” Bom, temos que reconhecer duas coisas. Primeiro que a imprensa defende seus interesses que muitas vezes se confundem com os dos grandes grupos empresariais que anunciam e utilizam as mídias na defesa de seus negócios. Segundo, reconhecer também que, salvo algumas heroicas exceções, nossa estrutura política tem gerado uma enorme desqualificação da classe política.


 


Esta estrutura está cheia de vícios e meandros, onde se amesquinha a atuação parlamentar e sobressaem os interesses de grupos econômicos, geralmente em detrimento das verdadeiras necessidades do cidadão ou da cidadã comum. E se nós, que trabalhamos e lutamos, não participarmos, não cobrarmos, sem vigiar e propor mudanças na vida política, não tenha dúvida que eles avançarão sobre nossos direitos, nossas conquistas.

Ela lembrou que, nesse caso, só votar não resolve o problema, porque vai ter sempre uma maioria que se beneficia dessas regras viciadas. Reconheci que ela estava certa. Votar é uma parte fundamental, e nosso povo lutou muito para reconquistar esse direito. Mas não podemos mais aceitar as regras atuais que priorizam os interesses da minoria que controla ou se vende ao capital. É por isso que várias entidades, como nosso sindicato e a CUT, estão se unindo para batalhar por uma ampla reforma política.


 


Disse a ela também que é preciso corrigir os vícios do atual modelo e estimular o surgimento de novas lideranças, por exemplo, jovens como ela que hoje estão descrentes da política, por considerá-la distante e injusta. É necessário melhorar os instrumentos de controle social sobre os políticos, acabando com os privilégios. Os atuais representantes eleitos pelo poder econômico estão distantes do Brasil real.


 


Este país é, na prática, feito por aqueles que realmente ralam para conquistar, pelo trabalho, seu espaço na sociedade.


 


Minha filha acrescentou: “Leis tipo ‘pisou na bola, dançou!’.”


 


Concordei, é por aí.

* Adriana Nalesso é vice-presidente do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro

Fonte: Adriana Nalesso