Almir Aguiar*
O Brasil tem diante de si, neste segundo governo da presidente Dilma, a rara oportunidade de eliminar e de passar a limpo erros do passado, cometidos contra a liberdade de expressão pela ditadura civil-militar e pelos governos eleitos que se seguiram, antes do mandato do presidente Lula. Precisamos regular a distribuição e a utilização das concessões de emissoras de rádio e de televisão, feitas mafiosamente em grande número, para beneficiar os aliados políticos dos poderosos de plantão. Imperava a velha política de favores, do tipo: “Você me dá apoio político e eleitoral e eu lhe concedo o direito de implantar uma emissora de rádio e de TV”. Um comportamento nada republicano. A liberdade de expressão vivia e vive abafada até hoje, porque os artigos da Constituição Federal de 1988 sobre a mídia, misteriosamente ainda não foram regulamentados. Vamos acabar com este mistério.
São centenas as emissoras de rádio e televisão distribuídas pelos antigos governos aos seus aliados políticos, e que se multiplicaram ao longo de décadas, com o acréscimo de emissoras repetidoras por todo o país, que foram se juntando às já existentes, até se transformarem em redes, em verdadeiros impérios, em um poder paralelo na República. Em vez do compromisso com a verdade dos fatos, TVs e rádios começavam a formar conglomerados para divulgar notícias cujo foco são os interesses de grupos beneficiados nas transações a que elas representam. Cresceu o oligopólio da comunicação, cujos lucros sustentam também veículos da mídia impressa, porque a vendagem destes vem caindo muito, por causa da internet. Seus proprietários querem manter negócios privilegiados sem a contrapartida de dedicarem, por exemplo, espaços a programações culturais e a debates de idéias que possam apontar caminhos novos para o Brasil. Comportam-se como se tivessem recebido títulos de nobreza do Brasil Império. Nós defendemos que haja critérios claros para as concessões serem feitas. Para impedir a abertura democrática da mídia, usam parlamentares testas-de-ferro dos seus interesses, como o novo presidente da Câmara dos Deputados, para não levar ao plenário do Congresso Nacional, a discussão e a votação da regulação da mídia.
Com os governos do PT, a sociedade organizada – movimentos sociais, forças progressistas, sindicatos, meio acadêmico, centrais sindicais, etc. – começaram a propor a regulamentação dos artigos 220, 221, 222, 223 e 224 do Capítulo 5, do Título VIII da Constituição Federal, que tratam dos meios de comunicação. Uma discussão sempre adiada para depois. Ao aspecto democrático da questão, soma-se agora a regulação econômica da mídia, que se transforma em uma das prioridades deste governo, comprometido com a verdadeira Liberdade de Expressão e com a soberania nacional. Do outro lado, os donos da mídia demonizam a sua democratização, amedrontam a opinião pública com o apoio de parlamentares-marionetes por eles eleitos, mentindo que nós, defensores da Democracia, queremos a censura.
A regulação da mídia é medida saneadora e já é realidade há muitos anos na maioria dos países democráticos. Ela impede que grandes grupos, representantes de determinados interesses, abocanhem os meios de comunicação para impor seu pensamento econômico e político, pois quando isto ocorre, a sociedade transforma cidadãos em súditos. No Brasil, onde não existe regulação, esses grupos se expandem e, nas eleições, elegem cada vez mais parlamentares que representam corporações e grupo financeiros, ao invés de representarem os interesses do povo. Isto é um dos processos de dominação das elites. É o coronelismo midiático. Por causa disto, os movimentos populares de Junho de 2013 mostraram nas ruas, às forças do atraso, que estamos vivendo o fenômeno da irrepresentatividade política. Cresce, cada vez mais, o distanciamento entre o povo e seus eleitos, entre o povo e as instituições.
A regulação econômica pode propiciar, por exemplo, como acontece na França, a obrigação das concessionárias de programar uma grade de produtos da indústria audiovisual nacional e o direito de todas as correntes de opinião terem seu espaço em rádio e TV para se expressar. Esta é a verdadeira liberdade de expressão. Não pregamos a censura, nem queremos que os veículos conservadores acabem. Jamais! Queremos que a Constituição assegure que a pluralidade de opiniões seja respeitada e tenha seu espaço garantido na mídia concedida.
Hoje, 70 % da mídia brasileira pertencem a seis impérios familiares, verdadeiras nobrezas coroadas, criadas à sombra de tenebrosas transações. A Constituição democrática de 1988, promulgada após 21 anos de ditadura civil-militar, precisa ser respeitada, garantindo que a pluralidade de pensamentos tenha seu espaço garantido. Todas as propostas apresentadas de regulamentação, pelos partidos políticos, serão discutidas com transparência e votadas abertamente no plenário do Congresso Nacional. Qual é o problema?.
É ridículo a grande mídia, seus protegidos e seus financiadores afirmarem que regulamentar suas atividades seja um golpe do PT. Trata-se de desculpa esfarrapada. É uma vontade de todos os democratas. As redes brasileiras produzem livremente, por exemplo, lixo televisivo para o povo consumir nas tardes de domingo e nos horários nobres. Querem ‘emburrecer’ o povão e impedir que este ouse pensar. Há espaço para todos e pensar faz bem.
Estados Unidos, Reino Unido, França, que são padrões de liberdade de expressão, têm há muitos anos modelos elogiados de regulação da mídia. Será que só nós, a sexta economia do mundo, é que ficaremos reféns do medo alardeado pelos grupos milionários, que querem controlar o nosso pensamento e a nossa opinião?
* Almir Aguiar é presidente do Sindicato dos Bancários do Rio
Fonte: Almir Aguiar