O momento é crucial. As favelas se espalham pela cidade, deixam de ser pequenos grupos de casas e começam a formar aglomerados, crescendo até dez vezes em uma década. Entender os 34 anos analisados pela socióloga Maria Lais Pereira da Silva em seu livro “Favelas cariocas — 1930-1964” é essencial para se conhecer um pouco melhor o lugar onde moram quase 20% da população carioca. E a pesquisa histórica feita pela autora será de grande ajuda.
Maria Lais, professora da Escola de Arquitetura e Urbanismo da UFF, recupera uma linha de estudos que perdeu força nas últimas duas décadas para trabalhos de caráter mais antropológico. O enfraquecimento destes estudos pode ter colaborado para a formação de preconceitos sobre as favelas. Um deles, que a autora desmancha, baseado em pesquisas de outros autores, é que favelas sempre foram invasões.
Rocinha surgiu de loteamento não regularizado
Ela relembra que a Rocinha, por exemplo, começou de um loteamento de 1927 que acabou não regularizado pela Prefeitura. Já a Mangueira foi uma ocupação incentivada pelo dono do terreno, que cobrava aluguel dos moradores. Para não serem removidos, os favelados se articularam politicamente.
Os marcos da análise — 1930 é a queda da República velha e 1964 é o ano do golpe militar — foram escolhidos pela importância para a história do país e também para a das favelas. Ela relembra que é neste período que o Brasil escolhe um modelo metropolitano de desenvolvimento, concentrando a industrialização na região sudeste.
A década de 30 é também quando as favelas se consolidam. Já havia no primeiro levantamento sobre o tema, em 1933, 46.192 casebres (20% do total de prédios). Para a autora, a crise imobiliária do período, gerada pela falência do modelo de “vilas operárias”, explica este crescimento das favelas.
Entre 1930 e 1964 a autora mostra que as favelas foram vítimas de uma constante alternância entre as políticas de remoção e urbanização, sem bons resultados para os favelados. O modelo de favelização atual, com invasões organizadas de terrenos, começa a se delinear no final deste período, no que parece uma conseqüência lógica para a falta de coerência estatal no trato do problema.
(Por Dimmi Amora – O Globo)
Favelas cariocas — 1930-1964, de Maria Lais Pereira da Silva. Editora Contraponto, 256 páginas. R$ 44.
Fonte: