O Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro realizou, na última segunda-feira, 14, no auditório da entidade, o debate “Visibilidade negra e Desigualdade no Sistema Financeiro”. A presidenta Adriana Nalesso abriu o encontro destacando a importância da discussão sobre a questão racial e a discriminação no mercado de trabalho no Brasil.
“É inadmissível que um setor tão lucrativo ainda discrimine negros e negras. Apenas 24% da categoria é negra e infelizmente poucos se reconhecem como negros. Vivemos num país multirracional e é fundamental vencermos a discriminação racial”, disse.
Debate com a Fenaban
O secretário de Combate ao Racismo da Contraf-CUT, Almir Aguiar, destacou que debates são fundamentais para a luta contra o preconceito.
“Em seu mais recente congresso, a Contraf-CUT criou a Secretaria de Combate ao Racismo e a Secretaria da Mulher, passos importantes no combate a toda forma de discriminação no setor financeiro”, disse. O sindicalista lembrou que a categoria bancária é uma das primeiras a aprovar, em sua Conferência Nacional, a defesa de mais negros e negras no mercado de trabalho.
“O Censo de 2014 mostra um avanço no número de negros no setor bancário. Havia no primeiro Mapa da Diversidade, 19,3% de negros. Em 2014, já são 24,9% de negros. Mas há ainda muito o que avançar se levarmos em conta que a população negra representa 53% do povo brasileiro”, acrescenta. Almir ressaltou que, no próximo dia 21 de novembro, o tema de debate com a Fenaban (Federação Nacional dos Bancos) será a questão racial nos bancos. Criticou a atual conjuntura de ataques do governo Temer a programas e políticas sociais conquistadas nos últimos anos. “
“Quando o governo propõe a PEC 241 (PEC 55, no Senado), que corta investimentos em programas como o bolsa família e o ProUni, a população negra é a mais atingida, por estar na base da pirâmide social”, afirma. Ele pediu que toda a categoria se una contra a sociedade preconceituosa para garantir um futuro mais justo e igualitário.”A nossa luta não é somente em novembro, a luta contra a discriminação e o preconceito é permanente, diuturnamente, esse é o caminho que buscamos, pois, a construção da igualdade, é o caminho de uma sociedade mais justa, num ambiente de trabalho justo, com uma participação maior de negros e negras. Assim, refletindo a sociedade brasileira de fato onde os negros representam 53% da população”, afirmou.
Banalização da violência
Mônica Custódio, que representou a CTB (Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil) no encontro, lembrou da importância da realização, no ano passado, da passeata que deu visibilidade a questão da mulher negra no Brasil e cujo lema era “Nós não começamos hoje, mas viemos de longe”, numa alusão à trajetória histórica da luta contra os preconceitos de gênero e raça.
“Ficamos chocados quando vemos um assassinato bárbaro ou um ato de terrorismo no exterior, mas muitas vezes não nos indignamos quando jovens negros são assassinados em Madureira ou se tornam vítimas de bala perdida nas comunidades pobres. A polícia no Brasil mata mais do que a guerra do Vietnã matou em dez anos”, critica. Denunciou ainda a farsa do mito da “democracia racial” no país e destacou a importância da comemoração dos 100 anos do samba como significado de luta, resistência e identidade da população e cultura negra.
História de racismo
O procurador do Ministério Público do Trabalho, PHD em Ciência Política pelo Iuperj/Uerj e pós-doutorando em jornalismo pela USP (Universidade de São Paulo), Wilson Prudente, deu uma aula de história do racismo institucional e ideológico e do combate ao racismo no Brasil. Ele é o relator da Comissão da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, na OAB/RJ, que defende a tese de que esta prática foi um crime contra a humanidade.
“Foi um avanço importante o STF, por unanimidade, reconhecer a existência de racismo no mercado de trabalho e na sociedade brasileira”, disse. O procurador, autor do livro “Justiça Global, contas raciais no Supremo Tribunal Federal – o regime internacional de combate ao racismo”, apresentado no debate, fez relatos chocantes sobre a violência contra negros no Brasil durante a escravidão.
“Cerca de 70% dos negros que sobreviveram as viagens e chegavam ao nosso país nos navios negreiros, eram jovens e meninos, não tinham mais que 18 anos e sofriam todo tipo de violência e castigo”, acrescenta. Fez um breve relato da Revolta da Chibata, quando o marinheiro João Cândido, liderou um movimento na Marinha contra as torturas de oficiais brancos contra os marinheiros negros, mulatos e nordestinos e em novembro de 1910, assumiu o controle dos principais navios da frota, direcionando os canhões para a Baía de Guanabara e contra o Palácio do Catete, na época sede do poder federal.
O palestrante considerou o levante o primeiro e único autêntico movimento de massa na história do Brasil.
No final, Prudente expressou sua indignação e preocupação contra a eleição de Donald Trump para a presidência dos EUA, “um nazista e louco”, segundo ele, que “em poder do maior arsenal nuclear do mundo, coloca a existência do planeta em risco. Lembrou ainda da reação e da violência racista quando àquele país colocou a primeira família negra na Casa Branca, com a eleição de Barack Obama.Destacou ainda a importância do movimento sindical na questão racial, a quem considera a vanguarda da luta contra o preconceito racial no movimento social e no país.
A diretora da Secretaria de Políticas Sociais do Sindicato, Kátia Branco, lembrou que o debate é apenas uma das atividades em comemoração ao mês da Consciência Negra, lembrando que no próximo dia 23 haverá um ato público na Praça XV e uma festa no Botequim Bancário Especial, com show da cantora Jô Borges, no dia 25, sexta-feira.
Fonte: Seeb Rio de Janeiro