Leonardo Boff*
Três são os inimigos principais da biodiversidade: o modelo de produção e consumo imperante, a monocultura e a espécie humana.
O modelo imperante, é imperioso repeti-lo, é devastador dos recursos naturais e é consumista. A Terra não agüenta mais esta sistemática agressão e dá sinais claros de estresse. Ela já está se vingando como o tem mostrado James Lovelock no seu recente e alarmante apelo”A vingança de Gaia”. Haja vista o aquecimento do Planeta, as perturbações climáticas e a escassez de água potável.
A monocultura é contrária à lógica da natureza que sempre consorcia todo tipo de formas de vida, permitindo que uma espécie ajude a outra a sobreviver e, ao mesmo tempo, se mantenha o equilíbrio dinâmico de todo o processo natural. O mundo é dominado pela monocutura do arroz, do trigo, da soja, do milho, do eucalipto, dos cítricos, do gado, das galinhas e outros. Cada implantação de uma monocultura significa um verdadeiro assassinato de espécies vivas, de insetos e microorganismos. Junto com a monocultura vêm os agrotóxicos para garantir e aumentar a produtividade.
O terceiro inimigo é a espécie humana. Ela é uma entre milhares de outras. Mas seu triunfo foi o de disseminar-se sobre todo o Planeta, como uma verdadeira praga, adaptando-se a todos os ecossistemas e submetendo a seus interesses todas as demais. Ocupou 83% do Planeta mas de forma destruidora. Fez do Jardim do Eden um matadouro como disse o mestre da biodiversidade Edward Wilson. As religiões, os tabus, os preceitos éticos e a ciência foram até hoje insuficientes para impedir e limitar a violência humana contra a natureza. O meteoro rasante hoje se chama ser humano.
“As atividades antrópicas estão mudando fundamentalmente e, em muitos casos, de forma irreversível, a diversidade da vida no planeta Terra. Tudo indica que esse processo vai continuar ou ainda se acelerar no futuro”. É o que constata o “Relatório da Avaliação Ecosistêmica do Milênio” feito sob os auspícios da ONU e divulgado em 2005.
Preocupante é que as centenas de medidas sugeridas pela Convenção sobre a Diversidade Biológica, seguramente necessárias, são feitas ainda dentro do paradigma antrópico de dominação da natureza. Elas não resolvem a questão básica da devastação. É como, se ao limarmos os dentes do lobo, lhe tiraríamos a ferocidade. Precisamos de outro paradigma civilizatório que tenha uma relação não destrutiva com a natureza, que atenda nossas necessidades, portanto que seja sustentável. Caso contrário não teremos mais futuro.
É neste contexto que se torna importante a Carta da Terra do ano 2000. Ela parte desta possível tragédia. Mas confia que podemos evitá-la. Para isso precisamos de outra ótica que fundará uma nova ética. A ótica é que somos parte do vasto universo em evolução, filhos e filhas da Terra que é viva e somos um dos membros da grande comunidade de vida. O sentido de interdependência e de parentesco nos torna os cuidadores naturais de todas as formas de vida. Há que satisfazer nossas necessidades, de forma justa e equitativa, com um manejo respeitoso da generosidade da Terra, mas sem devastá-la e sempre procurando repôr o que tiramos. Isso exige novos valores, diferentes instituições e modos de vida. Esse é o “modo sustentável de vida” que nos salvará.
* Leonardo Boff é autor de Civilização planetária (Ed. Sextante)
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