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Decretos de Natal

Frei Betto*


 


Fica decretado que, neste Natal, em vez de dar presentes, nos faremos presentes junto aos famintos e excluídos, como propõe o papa Francisco. Papai Noel será malhado como Judas e, lacradas as chaminés, abriremos corações e portas à chegada salvífica do Menino Jesus.



Fica decretado que encantaremos as crianças de mistérios ao professar o Deus que se fez homem entre nós. Não mais recorreremos ao velho barbudo de sorriso ridículo, e sim aos relatos bíblicos que narram o mais singular de todos os fatos históricos: em Belém, Deus se tornou humano para que possamos nos tornar divinos.



Por trazer a muitos mais constrangimentos que alegrias, fica decretado que o Natal não mais nos travestirá no que não somos: neste verão escaldante, arrancaremos da árvore de Natal todos os algodões de falsas neves; trocaremos nozes e castanhas por frutas tropicais; renas e trenós por carroças repletas de alimentos não perecíveis; e se algum Papai Noel sobrar por aí, que apareça de bermuda e sandália.



Fica decretado que, cartas de crianças, só as endereçadas ao Menino Jesus, como a do meu sobrinho Lucas, de 6 anos, que escreveu a ele convencido de que Caim e Abel não teriam brigado se dormissem em quartos separados; e propôs ao Criador ninguém mais nascer nem morrer, e todos nós vivermos para sempre.



Fica decretado que as crianças, em vez de brinquedos e bolas, pedirão bênçãos e graças, abrindo seus corações para destinar aos pobres todo o supérfluo que entulha armários e gavetas. A sobra de um é a necessidade de outro, e quem reparte bens partilha Deus.



Fica decretado que, pelo menos um dia, desligaremos toda a parafernália eletrônica, inclusive o telefone celular e, recolhidos à solidão e ao silêncio, faremos uma viagem ao interior de nosso espírito, lá onde habita Aquele que, distinto de nós, funda a nossa verdadeira identidade. Entregues à meditação, fecharemos os olhos para ver melhor.



Fica decretado que, despidas de pudores, as famílias farão ao menos um momento de oração, lerão um texto bíblico, agradecerão ao Pai de Amor o dom da vida, as alegrias do ano que finda, e até dores que exacerbam a emoção sem que se possa entender com a razão.



Fica decretado que arrancaremos a espada das mãos de Herodes e nenhuma criança será mais condenada ao trabalho precoce, violentada, surrada ou humilhada. Todas terão direito à ternura e à alegria, à saúde e à escola, ao pão e à paz, ao sonho e à beleza.



Fica decretado que, nos locais de trabalho, as festas de fim de ano terão o dobro de seu custo convertido em cestas básicas a famílias carentes. E será considerado grave pecado abrir uma bebida de valor superior ao salário mensal da pessoa que a serve.



Como Deus não tem religião, fica decretado que nenhum fiel considerará a sua mais perfeita que a do outro, nem fará rastejar a sua língua, qual serpente venenosa, nas trilhas da injúria e da perfídia. O Menino do presépio veio para todos, indistintamente, e não há como professar que ele é “Pai Nosso” se o pão também não for de todos, e não privilégio da minoria abastada.



Fica decretado que toda dieta  reverterá em benefício de quem tem fome, e que ninguém dará ao outro um presente embrulhado em bajulação ou mera formalidade. O tempo gasto em fazer laços seja muito inferior ao dedicado a dar abraços.



Fica decretado que as mesas de Natal estarão cobertas de afeto e, dispostos a renascer com o Menino, trataremos de sepultar iras e invejas, amarguras e ambições desmedidas, para que o nosso coração seja acolhedor como a manjedoura de Belém.



Fica decretado que, como os reis magos, haveremos de reverenciar, com a prática da justiça, aqueles que, como Maria e José, foram excluídos da cidade e, como uma família sem terra e teto, obrigados a ocupar um pasto, onde brilhou a esperança.


 


* Frei Betto é escritor, autor de “Um homem chamado Jesus” (Rocco), entre outros livros.
http://www.freibetto.org     twitter: @freibetto


 






Copyright 2014 – FREI BETTO – Favor não divulgar este artigo sem autorização do autor. Se desejar divulgá-los ou publicá-los em qualquer  meio de comunicação, eletrônico ou impresso, entre em contato para fazer uma assinatura anual. – MHGPAL – Agência Literária (
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Fonte: Frei Betto

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Mapa da corrupção

Frei Betto *


  


 


Sabe-se que a colonização da América Latina por países europeus, em especial Espanha e Portugal, foi profundamente marcada por roubos, saques, extermínio dos povos originários, escravidão e ampla corrupção daqueles que, no Novo Mundo, gerenciavam os interesses dos colonizadores.


  


Na América Latina, a corrupção é um legado de nossa herança colonial. Somos herdeiros de uma tradição escravocrata, que deixou profundas sequelas em nossas estruturas e em nossos hábitos. Para sobreviverem ou alcançarem funções de poder, muitos recorriam a subornos, ao peculato e ao nepotismo.


 


Na tradição política da América Latina, os recursos públicos têm sido apropriados em função de interesses privados. A lógica do sistema capitalista favorece esse caldo de cultura ao considerar que os privilégios do capital devem estar acima dos interesses do trabalho. Prática que se estende à “corrupção” da natureza através da devastação ambiental.


 


Há, pois, em todo o mundo, e especialmente na América Latina, uma verdadeira oligarquia cleptocrática, para a qual a corrupção é um mecanismo intrínseco ao sistema de contratos, acordos, negócios e transações, principalmente na relação com o poder público. A cleptocracia é tanto mais facilitada quanto menos se conta com mecanismos de controle social do Estado e da administração pública.


 


Essa corrupção inerente ao nosso sistema político latino-americano corrobora para desacreditar as instituições políticas e viciar sempre mais os processos eleitorais. No Brasil, as empresas não votam, mas ganham eleições…


 


Pesquisa da ONG Transparência Internacional, com sede em Berlim, divulgada em dezembro de 2013, apontou que Somália, Coreia do Norte e Afeganistão são os países onde há mais corrupção, enquanto Dinamarca e Nova Zelândia, seguidos de Luxemburgo, Canadá, Austrália, Holanda e Suíça se destacam como os países onde há mais transparência nas contas públicas.


 


Entre 177 países pesquisados, o Brasil figura em 72º lugar. Na América Latina, aparece como mais vulnerável à corrupção que Chile, Uruguai, Costa Rica e Cuba, entre outros. E menos que Argentina, Venezuela, Bolívia e Equador.


 


Dos países avaliados, em 70 % há fortes indícios de que funcionários públicos são maleáveis a subornos.


 


A Venezuela aparece na lista como um dos países onde há mais corrupção (160º lugar), enquanto os mais transparentes são o Uruguai (19º) e o Chile (22º).


 


Finn Heinrich, coordenador da pesquisa, admite que a corrupção atinge, em primeiro lugar, os mais pobres: “Se você observa os últimos países da lista, os cidadãos mais pobres são os mais prejudicados. Iraque, Síria, Líbia, Sudão e Sudão do Sul, Chade, Guiné Equatorial, Guiné-Bissau, Haiti, Turcomenistão, Uzbequistão e Iêmen figuram entre os países nos quais grassa mais corrupção na administração pública e nas empresas privadas. A corrupção está muito relacionada a países em decomposição, como Líbia e Síria.” É o caso também do Afeganistão.


 


 


 


* Frei Betto é escritor, autor de “Calendário do Poder” (Rocco), entre outros livros.
www.freibetto.org     twitter: @freibetto.


 


 


  





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Fonte: Frei Betto

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A Cigarra e a Formiga: fábula petista

Frei Betto*


 


A disputa presidencial se resumiu em um verbo predominante na campanha: desconstruir.

Em 12 anos de governo, o PT construiu, sim, um Brasil melhor, com índices sociais “nunca vistos antes na história deste país”. Porém, como partido, houve progressiva desconstrução.

A história do PT tem seu resumo emblemático na fábula A cigarra e a formiga, de Esopo, popularizada por La Fontaine. Nas décadas de 1980/90, o partido se fortaleceu com filiados e militantes trabalhando como formigas na base social, obtendo expressiva capilaridade nacional graças às Comunidades Eclesiais de Base, ao sindicalismo, aos movimentos sociais, respaldados por remanescentes da esquerda antiditadura e intelectuais renomados.

No fundo dos quintais, havia núcleos de base. Incutia-se na militância formação política, princípios ideológicos e metas programáticas. O PT se destacava como o partido da ética, dos pobres e da opção pelo socialismo.

À medida que alçou a funções de poder, o PT deixou de valorizar o trabalho formiga e passou a entoar o canto presunçoso da cigarra. O projeto de Brasil cedeu lugar ao projeto de poder. O caixa do partido, antes abastecido por militantes, “profissionalizou-se”. Os núcleos de base desapareceram. E os princípios éticos foram maculados pela minoria de líderes envolvidos em maracutaias.

Agora, a cigarra está assustada. Seu canto já não é afinado nem ecoa com tanta credibilidade. Decresceu o número de sua bancada no Congresso Nacional. A proximidade do inverno ameaça.

Mas onde está a formiga com suas provisões? Em 12 anos, os êxitos de políticas sociais e diplomacia independente não foram consolidados pela proposta originária do PT: “organizar a classe trabalhadora” e os excluídos.

Os avanços socioeconômicos coincidiram com o retrocesso político. Em 12 anos de governo, o PT despolitizou a nação. Preferiu assegurar governabilidade com alianças partidárias, muitas delas espúrias, em vez de estreitar laços com seu esteio de origem, os movimentos sociais.

Tomara que Dilma cumpra sua promessa de campanha de avançar nesse quesito, sobretudo no que diz respeito ao diálogo permanente com a juventude, os sem-terra e os sem-teto, os povos indígenas e os quilombolas.

O PT, até agora, robusteceu o mercado financeiro e deu passos tímidos na reforma agrária. Agradou as empreiteiras e pouco fez pelos atingidos por barragens. Respaldou o agronegócio e aprovou um Código Florestal aplaudido por quem desmata e agride o meio ambiente.

É injusto e ingênuo pôr a culpa da apertada e sofrida vitória do PT nas eleições de 2014 no desempenho de Dilma. Se o PT pretende se refundar, terá que abandonar a postura altiva de cigarra e voltar a pisar no chão duro do povo brasileiro, esse imenso formigueiro que, hoje, tem mais acesso a bens materiais, como carro e telefone celular, mas nem tanto a bens espirituais: consciência crítica, organização política e compromisso com a conquista de “outros mundos possíveis”.

* Frei Betto é escritor, autor de “A mosca azul – reflexão sobre o poder” (Rocco), entre outros livros.
www.freibetto.org     twitter: @freibetto.




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Fonte: Frei Betto

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Papa consagra teoria da evolução

Frei Betto *



O evolucionismo e o Big Bang não são incompatíveis com a existência de um Criador, declarou o papa Francisco à Academia de Ciências do Vaticano, a 28/10/2014: “Quando lemos a respeito da Criação no Gênesis, corremos o risco de imaginar que Deus era um mágico, com varinha de condão capaz de tudo fazer. Mas isso não é assim.”



A declaração coincide com o momento em que membros da Academia Brasileira de Ciências se reunirão, em Campinas, no 1º Congresso Brasileiro do Design Inteligente. Alguns desses cientistas defendem a teoria do TDI (Teoria do Design Inteligente), segundo a qual uma Inteligência Suprema, que muitos denominam Deus, criou diretamente a complexidade da célula humana.



A teoria da evolução afirma que todos os seres vivos descendem de um ancestral comum, e que o principal mecanismo responsável pelo surgimento das características desses seres é a seleção natural. Já o Big Bang é a explosão primordial que deu origem ao Universo.



A teoria do Big Bang foi esboçada pelos cálculos de Alexander Friedmann. Em 1927, o padre e cosmólogo belga George Lemaître publicou um artigo defendendo-a. Se as galáxias continuam a se afastar umas das outras, isso significa que, no passado, estiveram mais próximas. Considerada a distância dessa proximidade num tempo demasiadamente longo, então se conclui que houve um momento em que não havia espaços vazios entre as galáxias. Todo o céu era feericamente iluminado. Portanto, antes desse tempo teria existido uma época em que não havia espaços vazios entre as estrelas, precedido por um tempo em que não havia espaço entre os átomos e os núcleos no interior dos átomos.



Lemaître imaginou que, “um dia”, todo o Universo coube numa esfera que batizou de “átomo primordial”. Ele teria explodido e se fragmentado em partículas elementares que formaram átomos, estrelas e galáxias, sem que houvesse explosão audível, pois não existiam ondas sonoras, e tanto o espaço quanto o tempo teriam tido início a partir daí.



Teria o inconsciente de Lemaître o remetido à imagem bíblica da Criação? Por ser ele sacerdote, sua teoria serviu de motivo de gracejos durante anos. Em 1927, ele tentou se aproximar de Einstein na 5ª Conferência Solvay, em Bruxelas, a fim de defender seu ponto de vista. O cientista alemão foi rude: “Seus cálculos são corretos, mas sua visão física é abominável.”



Einstein, além de se sentir incomodado por uma cosmologia que negava seu Universo estático, desconfiava que Lemaître, como religioso, pretendia harmonizar a origem do Universo com a Criação bíblica.



Em 1931, em sua edição de 19 de maio, o New York Times deu em manchete: “Lemaître sugere que um único grande átomo, que continha toda a energia, foi o princípio do Universo.” Tornou-se uma celebridade, a ponto de Einstein reparar seu preconceito e, malgrado sua falta de convicção, admitir que a tese do jovem sacerdote era a “maior, mais bela e satisfatória interpretação de fenômenos astronômicos.”



Em 1996, João Paulo II admitiu: “Novas descobertas nos levam a reconhecer que a evolução é mais do que uma hipótese. A convergência dos resultados de estudos independentes constitui, em si mesma, argumento significativo em favor da teoria.” E, em nome da Igreja Católica, penitenciou-se e reabilitou Galileu Galilei e Charles Darwin.



A TDI mescla inadequadamente religião e ciência e, a partir de uma leitura literal da Bíblia, defende que descendemos de seu Adão e dona Eva. Ora, Adão, em hebraico, significa “terra”; e Eva, “vida”. O autor do Gênesis não teve intenção de ensinar ciência, e sim que Deus incutiu em sua Criação uma dinâmica evolutiva própria, ora desvendada pela ciência.



Se Adão e Eva tiveram dois filhos homens, Caim e Abel, como estamos aqui? Os criacionistas aprovam o incesto de Eva com seus filhos?



Pobre da fé que busca na ciência muletas para se sustentar. Infeliz da ciência que se arvora em negar ou afirmar a existência de Deus.



* Frei Betto é escritor, autor de “A obra do Artista – uma visão holística do Universo” (José Olympio), entre outros livros.
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Fonte: Frei Betto

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Dois caminhos, duas histórias!

Há uma década, seria difícil pensar que desemprego massivo, precarização do trabalho, pobreza ou exclusão social seriam expressões que poderiam descrever muitos países da União Europeia. É assim que o economista Jorge Aragón, diretor da Gazeta Sindical, e o secretário de Organização e Comunicação da Confederación Sindical de Comisiones Obreras (CCOO) abrem a edição de número 22 da publicação.

O presidente da Confederação Europeia de Sindicatos, Ignacio F. Toxo, avança, afirmando que, com a crise internacional e a forma de enfrentamento, a distribuição de riqueza perde equidade, ampliam-se as distâncias entre países e a desigualdade entre as pessoas.
O caminho para a saída da crise nos países centrais tem sido o de ajuste fiscal, redução dos gastos e do investimento público, alta dos impostos, queda da atividade econômica, aumento do desemprego, arrocho salarial, destruição de direitos trabalhistas, tudo para que o orçamento público salve o sistema financeiro, preserve o estoque de riqueza e a renda de poucos. Bem, esse é o caminho neoliberal.

Recentemente, o FMI voltou a cortar as projeções de crescimento para a economia mundial, alegando que o desempenho tem sido decepcionante, com performances desiguais entre países e regiões. A Europa patina na recessão, o Japão permanece parado, os Estados Unidos, depois de um primeiro semestre ruim, apresenta sinais de melhora. As taxas de crescimento dos países em desenvolvimento também foram reduzidas pelo impacto que o travamento das economias desenvolvidas acarretou.

No Brasil, foi construído outro caminho. Em outubro de 2008, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou para uma conversa os membros do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES). Na oportunidade, os conselheiros apresentaram a ele a intepretação que tinham sobre a gravidade da crise e a importância de o Brasil preservar a qualidade e a liquidez do sistema financeiro, garantir crédito etc. Foi destacado que seria fundamental sustentar o mercado interno de consumo, preservar empregos e salários.

“Como poderíamos sinalizar que vamos gerar mais empregos?”, perguntou Lula. E a resposta foi: um grande investimento em habitação geraria emprego rapidamente, reduziria desigualdades e melhoraria a qualidade de vida das pessoas.

O presidente colocou o pé no acelerador e, no começo de 2009, lançou o Programa Minha Casa, Minha Vida, com o anúncio da construção de 1 milhão de moradias. Desde o início, o caminho escolhido foi o de enfrentar a crise com medidas de caráter e qualidade distintos daqueles que fazem parte do receituário neoliberal.

O caminho que o Brasil trilhou é também difícil de ser percorrido. Exige muito de todos, em especial do Estado e do governo, que enfrentam inclusive a ideologia neoliberal que desqualifica esse caminho. Trata-se de mobilizar todos os recursos econômicos, fiscais e políticos para preservar o emprego, os salários, a dinâmica interna de consumo e produção, adequar-se à perversa competitividade internacional de excesso de capacidade produtiva.


 


Um caminho de crescimento mais lento, porque mobiliza todos para o enfrentamento; porque não joga para toda a sociedade o custo do enfrentamento; porque é capaz de preservar os direitos, o emprego, os salários, sustentar a demanda interna, a atividade empresarial e construir uma saída afirmativa.

É esse caminho que deve ser seguido, ampliado e aprofundado. Os ajustes futuros devem visar melhorar a performance dessa política. Nesse caminho, deve-se ousar articular, de forma mais aprofundada, o emprego e o salário, com dinamização industrial integrada aos setores agropecuário e de serviços, com base na sustentabilidade ambiental dos processos produtivos, da qualidade dos produtos e da forma de uso; ampliar o investimento em infraestrutura econômica e social, no desenvolvimento dos serviços e equipamentos urbanos, entre outros desafios estratégicos.

Esse é o caminho para avançar nas atuais bases para o desenvolvimento econômico e social. É a rota que tem sido trilhada! Hoje, com orgulho, podemos dizer para os companheiros sindicalistas europeus: o Brasil fez diferente e precisa continuar fazendo. Almejamos, e queremos cooperar na luta política, para que o caminho que estamos trilhando seja em breve novamente a escolha dos governos europeus. Aqui temos feito nossa parte!

Fonte: Clemente Ganz Lúcio

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Fortalecer bancos públicos para gerar desenvolvimento e distribuição de renda

Carlos Cordeiro*



 
Especialista em especulação financeira, o ex-presidente do Banco Central no período final do governo FHC, quando elevou a taxa Selic para 24,9 % , Armínio Fraga, nome de Aécio Neves para ministro da Fazenda, tem uma antiga obsessão em desmontar os bancos públicos, para atender a um velho desejo dos bancos privados e dos neoliberais.



No dia 26 de junho de 2000, o jornal Valor Econômico publicou matéria de seu correspondente nos Estados Unidos, Cristiano Romero, com o título “Fraga anuncia debate para privatizar BB”, na qual informa que o então presidente do BC participou de “reunião fechada com um grupo de investidores em Nova York (…) organizado pelo banco americano Merill Lynch”, para “iniciar um debate sobre a possível privatização do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal”.



Segundo o jornal, “Fraga revelou que o governo está preparando relatórios detalhados sobre as atividades dos dois maiores bancos federais”, um dos quais foi encomendado a um consórcio formado pelas consultorias Booz Allen, Hamilton & Fipe, na sequência das privatizações da Telebras, da Vale do Rio Doce e da CSN.



Depois de Nova York, acrescentou o Valor, Fraga manteve outra reunião com investidores em Boston, para “conversas preparatórias para a rodada de apresentação que a Petrobras e o BNDES farão no exterior, nas próximas semanas, sobre a venda das ações que excedem ao controle da União na estatal”.



Em áudio que circula atualmente pela internet, gravado no ano passado durante palestra no Instituto Liberal, Armínio Fraga voltou ao tema das privatizações. Disse ele: “Penso que os bancos públicos precisam ser administrados por padrões muito mais rígidos. Provavelmente vai chegar um ponto em que talvez não tenham tantas funções. Não sei muito bem o que vai sobrar no final da linha. Talvez não muito.”



Confira aqui a declaração



É mais ou menos o que já propunha em 2000 o estudo do consórcio Booz Allen, Hamilton & Fipe sobre o papel do BB, da Caixa, do BNDES, do BNB e do Banco da Amazônia. Entre as alternativas apontadas, estavam a fusão de alguns e a privatização pura e simples de outros.



A sociedade brasileira não pode permitir esse retrocesso à década neoliberal dos tucanos e abrir mão dos bancos públicos, cuja importância para o desenvolvimento econômico e social do país tornaram-se mais evidentes do que nunca a partir da crise internacional de 2008, provocada pela irresponsabilidade do mercado financeiro a que Armínio Fraga representa.



Foi graças à atuação dos bancos públicos que o Brasil superou a crise. Os bancos privados fecharam a torneira e encareceram o crédito. Por decisão do governo, os bancos públicos ampliaram a oferta de crédito. Antes da crise, eles detinham 36 % das operações de crédito de todo o sistema financeiro. Saltaram para 51 % do mercado, mantendo assim a roda da economia funcionando, o consumo aquecido e gerando empregos.



Sem o aumento da oferta de crédito do BB para a agropecuária, a agricultura familiar, para empresas e consumidores, o Brasil não teria saído da crise muito mais rápido que qualquer país do mundo. Sem o financiamento da Caixa, não estaria fazendo o maior programa de construção de moradia de toda a História. Sem os financiamentos do BNDES, o Brasil não estaria modernizando suas estradas, portos, aeroportos, retomando a construção de ferrovias, obras de metrô e corredores de ônibus, usinas hidrelétricas e eólicas, dentre tantas outras coisas.



Além disso, os bancos públicos atuaram na crise como reguladores do spread bancário, multiplicando suas bases de clientes com crédito mais barato.



Agora os bancos privados, que na crise preferiram especular com o dinheiro empoçado e não cumpriram sua função de intermediação financeira, exigem a retração dos bancos públicos e a elevação da Selic, para que possam retomar o espaço perdido e aumentar seus lucros com os juros da dívida pública.



E é isso que o “ministro da Fazenda” de Aécio, que se tornou conhecido como operador do megaespeculador George Soros e hoje é sócio do banco norte-americano JP Morgan na Gávea Investimentos, está oferecendo à banca nacional e internacional.



Por isso o mercado financeiro está fazendo esse verdadeiro terrorismo eleitoral para eleger o candidato que atenderá suas demandas, além de ganhar dinheiro com a especulação na Bolsa de Valores – entidade, aliás, cujo Conselho de Administração já foi presidido por Armínio Fraga.



Nós, bancários, ao contrário, acreditamos que somente os bancos públicos podem se contrapor a essa política predatória do mercado financeiro contra o orçamento público e contra a sociedade. E por isso precisam ser fortalecidos, para que ampliem ainda mais a sua participação no financiamento do desenvolvimento econômico e social do país, com geração de empregos e distribuição de renda.


 


* Carlos Cordeiro é presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT)

Fonte: Carlos Cordeiro

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Haja fome!

Frei Betto *

Suponho que o leitor e a leitora jamais tenham passado fome. No máximo, abriram o apetite… Por força das circunstâncias, sei o que é passar fome. Destituído arbitrariamente de meus direitos de preso político, garantido por convenções internacionais firmadas pelo Brasil, fui transferido para o meio de presos comuns nos últimos dois anos dos quatro em que fiquei preso sob a ditadura (1969-1973). Em protesto, fiz greve de fome. A primeira, de 6 dias; a segunda, de 33. Sem ingerir nenhum alimento sólido.

“A fome é amarela”, escreveu Carolina Maria de Jesus em seu relato autobiográfico Quarto de despejo. Acrescento, é também humilhante. A humilhação resulta de ver tanta comida estocada em supermercados, tanto desperdício, e a uma pessoa faltar a segurança de que, no outro dia, não terá de mendigar para merecer o mais básico de todos os direitos animais!

A um ser humano pode faltar tudo, até roupa e moradia, dependendo das condições climáticas (como é o caso dos indígenas isolados na Amazônia brasileira), menos comida e bebida. São os nutrientes essenciais.

A 16 de setembro a FAO (Organização da ONU para a Alimentação e a Agricultura) divulgou que, no Brasil, entre 2001 e 2012, a miséria caiu de 14 % da população para 3,5 % , e a pobreza, de 24,3 % para 8,4.

Isso graças ao Fome Zero e ao Bolsa Família, ao baixo índice de desemprego e ao aumento anual do salário mínimo acima da inflação. E também ao Programa Nacional de Alimentação Escolar, que proporciona refeições gratuitas aos alunos das escolas públicas. Ele beneficiou, em 2012, 43 milhões de crianças.

Há hoje, no Brasil – quarto produtor mundial de alimentos – 3,4 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar. É como se toda a população do Uruguai tivesse excluída do direito de três refeições diárias. Mas segundo Walter Belik, especialista da UNICAMP em segurança alimentar, são 16 milhões os brasileiros que, todos os dias, dormem de barriga vazia.

“O combate à fome é uma questão política, de vontade e interesse dos governantes”, afirma Jorge Chediek, representante, no Brasil, do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).

No mundo, entretanto, os dados são mais alarmantes. Passam fome 870 milhões de pessoas, ou seja, 12,5 % da população do planeta. Falta de alimentos? Não. Produz-se o suficiente para alimentar 12 bilhões de bocas. E somos 7 bilhões. Faltam, sim, justiça, partilha, sensibilidade para com os direitos alheios.

Calcula-se que, no mundo, o desperdício anual de alimentos é de 1,3 bilhão de toneladas. O que causa um prejuízo, segundo a FAO, de 750 bilhões de dólares, sobretudo por falta de reutilização (como adubo orgânico, por exemplo) e reciclagem.

Ao lado dos famintos estão os que têm fome demais, comem excessivamente, tornam-se obesos. Calcula-se que 15 % das crianças brasileiras sofrem de obesidade precoce. Consomem açúcares em demasia, gorduras saturadas, alimentos “saborosos” de pouco valor nutricional.

É hora de nossas escolas introduzirem Educação Nutricional: como se alimentar; como reciclar; como partilhar e não desperdiçar.

* Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Maria Stella Libanio Christo, de “Fogãozinho – culinária em histórias infantis” (Mercuryo Jovem), entre outros livros.
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Papa busca identificar a família atual

Frei Betto *

Desde de 5 de outubro, até o próximo dia 19, reúne-se em Roma o Sínodo Extraordinário sobre a Família. Convocado pelo papa Francisco em outubro de 2013, esta reunião de bispos do mundo inteiro foi precedida pelo debate em torno de documento sobre os desafios à Igreja, dentre os quais os novos perfis de família. O tema será retomado no Sínodo Ordinário de 2015.

Constata o documento: “Hoje perfilam-se problemáticas até há poucos anos inéditas, desde a difusão dos casais de fato, que não acedem ao matrimônio e, às vezes, excluem esta própria ideia, até as uniões entre pessoas do mesmo sexo, às quais não raramente é permitida a adoção de filhos. Entre as numerosas novas situações que exigem a atenção e o compromisso pastoral da Igreja, será suficiente recordar: os matrimônios mistos ou interreligiosos; a família monoparental; a poligamia; os matrimônios combinados, com a consequente problemática do dote, por vezes entendido como preço de compra da mulher; o sistema das castas; a cultura do não comprometimento e da presumível instabilidade do vínculo; as formas de feminismo hostis à Igreja; os fenômenos migratórios e a reformulação da própria ideia de família; o pluralismo relativista na noção de matrimônio; a influência dos meios de comunicação sobre a cultura popular na compreensão do matrimônio e da vida familiar; as tendências de pensamento subjacentes a propostas legislativas que desvalorizam a permanência e a fidelidade do pacto matrimonial; a difusão do fenômeno das mães de substituição (“barriga de aluguel”); e as novas interpretações dos direitos humanos. Mas, sobretudo, no âmbito mais estritamente eclesial, o enfraquecimento ou abandono da fé na sacramentalidade do matrimônio e no poder terapêutico da penitência sacramental.”

Francisco vai direto ao ponto, ao contrário de outros papas que, para não criar atritos com os conservadores, preferiam deixar às calendas temas candentes que exigem, com urgência, posicionamento da Igreja, como aborto, sacerdócio de mulheres, volta ao ministério sacerdotal de padres casados, homossexualidade, celibato obrigatório etc.

O documento preparatório explicitou as preocupações do papa, entre as quais como evangelizar crianças de pais divorciados impedidos de se aproximar dos sacramentos? Podem os divorciados participar da eucaristia?

O documento enviou a todas as dioceses do mundo perguntas cujas respostas servem agora de base ao Sínodo Extraordinário. Entre elas, o tópico “Sobre as uniões de pessoas do mesmo sexo: a) Existe no vosso país uma lei civil de reconhecimento das uniões de pessoas do mesmo sexo, equiparadas de alguma forma ao matrimônio? b) Qual é a atitude das Igrejas particulares e locais, quer diante do Estado civil promotor de uniões civis entre pessoas do mesmo sexo, quer perante as pessoas envolvidas neste tipo de união? c) Que atenção pastoral é possível prestar às pessoas que escolheram viver em conformidade com este tipo de união? d) No caso de uniões de pessoas do mesmo sexo que adotaram crianças, como é necessário comportar-se pastoralmente, em vista da transmissão da fé?”

Não se espere desta reunião decisões que, da noite para o dia, mudem o comportamento pastoral da Igreja Católica. Instituição bimilenária, seus avanços são cautelosos.

No entanto, Francisco tem pressa. Conhece os escândalos no interior da Igreja: casos gritantes de pedofilia (que ele pune com rigor); congregações religiosas que se transformaram em grandes empresas famintas por lucros; casais que mantêm relações sexuais sem intenção de procriar (o que é vetado pela doutrina em vigor); jovens que perdem a virgindade antes do casamento; relativização da ideia de pecado etc.

O fundamento da família é o amor. “Deus é amor” e “quem ama nasceu de Deus”, diz João no capítulo 4 de sua primeira carta. De que vale uma família desprovida de amor? E Deus não se faz presente em toda verdadeira relação amorosa, ainda que fuja ao modelo de família próprio da modernidade?

Sonho com o dia em que um casal de jovens, ao experimentar a primeira paixão, saiba que faz experiência de Deus!

* Frei Betto é escritor, autor do romance “Aldeia do silêncio” (Rocco), entre outros livros.
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Fonte: Frei Betto

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Para não esquecer

Por Nilton Damião Esperança

Nos últimos 20 anos nosso país mudou muito, e para melhor. Em 1994 o Governo Itamar formulou o Plano Real que colocou nossa economia em outro patamar, além de ter proporcionado uma grande distribuição de renda. O Governo FHC (1995/2002) deu continuidade a esta estabilidade econômica, mas optou pelo liberalismo econômico.
As privatizações foram e são um ponto de honra para os tucanos. Constantemente, eles citam o vasto número de celulares que temos hoje, mas não falam que, em virtude de uma privatização feitas às pressas, e com inúmeras irregularidades, também temos tarifas das mais caras do mundo. Falando nisso, poucos se lembram do escândalo de corrupção da Telebrás, que envolveu o Banco Opportunity. Não é de se estranhar, pois na época tínhamos um “engavetador geral da republica”, e uma Policia Federal esvaziada.

Além das privatizações, foram oito anos em que empresas públicas ficaram sem reajuste salarial, categorias sem ganho real, universidades federais foram sucateadas, surgiu o Fator Previdenciário, e por consequência, o governo desferiu um brutal ataque aos sindicatos.

Tudo apoiado pela grande mídia, que não gastou uma linha para denunciar o mensalão mineiro, que financiava a reeleição de FHC, em 1998.

O governo Lula (2003/2010) manteve a estabilidade econômica, mas ao invés de optar pelo monetarismo econômico, foi em direção à construção de uma agenda de inclusão social, que conseguiu reduzir a taxa de pobreza de 40 % para 9 % .

Começamos a perceber que não precisávamos ter “medo de ser feliz”, pois era possível o Brasil crescer, ao mesmo tempo em que suas sofridas classes C, D e E passavam a ter casa, carro, faculdade (graças ao FIES), viajar de avião etc.


 


Em 2008 veio uma crise econômica mundial, e enquanto países ricos amargavam com o desemprego, nossas taxas se mantinham estáveis.

Em nome dessa eficiente política que conjugava distribuição de renda com crescimento econômico, Lula, no alto de sua enorme popularidade, elegeu sua sucessora, a Ministra Dilma Rouseff. Mas o mundo era outro, e os ventos da prosperidade econômica deixaram de soprar. Mesmo assim, a agenda social do governo se manteve, e até avançou. Categorias continuaram a ter aumento real de salário, o desemprego vem se mantendo baixo, e num momento em que partidos conservadores tentavam passar no Congresso o PL4330, contamos com o apoio desse governo para que este nefasto projeto para a classe trabalhadora fosse arquivado.

Nesses últimos 12 anos, nós, sindicalistas, nunca tivemos medo de criticar ou de apontar erros que o Governo cometeu. Mas também sempre soubemos que 500 anos de desmandos não vão terminar em uma década. Quem tem hoje seus tenros 20 ou 30 anos e iniciou sua vida laboral nos governos do PT não tem a noção do que foram os bicudos anos do governo PSDB. Influenciados por uma massiva campanha anti-PT da grande mídia, chegam à conclusão, simplista, de que é hora de mudar.

Independente disso, voltar a uma política de exclusão social, aumento da violência, reajuste zero, ataques aos sindicatos, escândalos de corrupção abafados pela grande mídia, e fazer com que os pobres voltem a pagar a conta dos ricos, não tem nada de mudança e sim de retrocesso.

Ser anti-PT é fácil o que não podemos é ser anti-Brasil!

Nós que vivemos tempos difíceis e vivemos hoje num país melhor temos a obrigação cívica de apoiar a Dilma nesse segundo turno, e poder dizer, daqui a 20 anos, que nosso pais mudou muito, e para melhor.

Agora, pergunto: Aécio e o PSDB são a mudança? Parece que seu Estado, Minas Gerais não acha…

VOTE DILMA!


 

Fonte: Por Nilton Damião Esperança

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Campanha salarial e desenvolvimento econômico

Clemente Ganz Lúcio *

Campanhas salariais são processos complexos nos quais os trabalhadores se mobilizam para estabelecer as regras que definirão os salários e as condições de trabalho no próximo período de um ano ou mais. A mobilização e a organização sindical influenciam o clima das mesas de negociação, que buscam os acordos.


O momento da negociação é fundamental para definir (e garantir) as condições de produção, os salários, os benefícios (alimentação, saúde, creche, entre outros) e condições laborais (jornada, segurança, saúde, etc.), disputando parte da riqueza gerada pelo trabalho. No primeiro semestre de 2014, para os trabalhadores, a negociação foi exitosa. Segundo pesquisa do DIEESE, houve aumento salarial em 93 % das Convenções ou Acordos Coletivos celebrados no período. A maioria dos ganhos reais variaram entre 1 % e 3 % .


Esses resultados, um dos melhores da série histórica da pesquisa para o primeiro semestre, ocorreu porque há um ambiente econômico favorável no Brasil. A grave crise internacional colocou, já há algum tempo, as maiores economias em recessão e trouxe para os trabalhadores desemprego, arrocho salarial e perda de direitos. A economia brasileira resistiu à conjuntura adversa que assolou diversos países, isso porque privilegiou o mercado interno de consumo e de produção, gerando emprego e renda, consumo de massa, o que animou a produção e manteve os ganhos das empresas.


Nesse cenário, o emprego cresceu, o desemprego e a informalidade diminuíram, o que trouxe de volta o ânimo dos trabalhadores para a luta sindical. O ambiente das mesas de negociação repercutiu o ganho de lucro por parte das empresas e a disposição dos trabalhadores para buscar melhores salários, benefícios e condições de trabalho.


O desempenho da economia é a base para o avanço dos resultados das negociações coletivas. Colocar, como foi feito no Brasil, o emprego e o salário na frente da estratégia de desenvolvimento econômico é fato raro na história econômica do país. É urgente fortalecer essa estratégia com investimentos para ampliar a capacidade produtiva das empresas, para a inovação, para a agregação de valor na industrialização, articulada com a produção no campo, os serviços e o comércio, bem como ampliar a capacidade do Estado para ofertar serviços públicos de saúde, educação, transporte, moradia e infraestrutura econômica (estradas, energia, portos, aeroportos, etc.).


Lutar para favorecer essas dimensões do desenvolvimento econômico é essencial para o acordo que melhorará a vida dos trabalhadores.



* Clemente Ganz Lúcio é sociólogo, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) e do Conselho de Administração do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE)

Fonte: Clemente Ganz Lúcio