O programa de TV “Direitos de Resposta”, produzido para se contrapor e ocupar o lugar do programa “Tarde Quente”, de João Kleber, foi exibido pela última vez na Rede TV! nesta sexta-feira (20). As ONGs envolvidas na construção da “resposta” a João Kleber, que violou uma série de direitos humanos com seu programa, têm planos para o futuro. “Ainda haverá outras ações para garantir o controle da sociedade sobre os programas de TV que têm cunho homofóbico ou expõem pessoas ao ridículo”, afirma Diogo Moyses, representante da Intervozes, organização não-governamental que luta pelo direito público para a comunicação.
Moyses informa, ainda, que o “Direitos de Resposta” deve ser transformado em uma caixa de DVDs. Esta caixa deve ser distribuída a instituições públicas e organizações não-governamentais. “É uma chance de garantir o acesso da sociedade a estes debates sobre direitos humanos”, diz ele, que relata a intenção da Intervozes em entregar a caixa para bibliotecas, universidades, colégios e emissoras públicas. Aos demais interessados, a Intervozes informa que a venda da caixa será feita a preço de custo – R$ 15.
A avaliação do Procurador da República Sergio Suiama sobre o programa é a mesma dos membros das ONGs. “A sociedade saiu vitoriosa”, diz Suiama, “e o programa fez uma discussão qualificada, em um formato agradável e com ótimo retorno do público”. A audiência do “Direitos de Resposta” oscilou entre um e dois pontos de audiência no Ibope. Segundo Moyses, houve muitos e-mails e comentários no blog do programa. “Os espectadores que não conheciam a proposta do programa o aprovaram”, diz ele, para quem há esperanças de vitória sobre o mito de que “o povo gosta de baixaria e má qualidade”.
Suiama crê ser sintomática a permanência do programa “Tarde Quente” como um dos mais altos no ranking da campanha “Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania” no ano passado. “Além de violar os direitos humanos, João Kleber nos acusou de sermos moralistas”, diz ele. Para Moyses, as transgressões do apresentador foram objetivas: incentivar a violência contra a mulher, contra negros e contra homossexuais. “Só isso basta”, relata, enfaticamente, o militante.
A saída de João Kleber, de acordo com Moyses, pode ter sido prevista pela emissora. “O programa Tarde Quente não foi proibido pela Justiça de voltar ao ar, mas apenas deveria ser remanejado para um horário adequado, de madrugada”. Para o militante, houve uma “autocrítica” por parte da Rede TV!, que não renovou o contrato do apresentador.
Correria e poucos recursos
A linha política do programa foi elaborada por um comitê, que reuniu representantes das seis ONGs envolvidas e do Ministério Público Federal. De acordo com Michelle Prazeres, que também é da Intervozes, a produção do programa começou dez dias antes de sua estréia. “Foi muito difícil e complicado”, diz ela. A Justiça determinou que a Rede TV! pague R$ 200 mil para a produção dos programas e R$ 400 mil de indenização, que serão depositados no Fundo Federal de Direitos Difusos, destinado a financiar projetos de direitos humanos em todo o Brasil. “Apesar dos parcos recursos, o comitê está satisfeito com o resultado do programa”, afirma Prazeres.
A programação do “Direitos de Resposta” incluiu trechos de vídeos produzidos por movimentos sociais, ONGs e militantes que abordaram os direitos humanos. Para Michelle, o número de vídeos enviados para a produção do programa – foram mais de 400 – mostra que a sociedade civil acompanhou de perto o caso da retirada do programa de João Kleber do ar.
Precedentes
Para o procurador Suiama, estão abertos precedentes para o exercício da Constituição Federal no que diz respeito ao artigo sobre Comunicação Social. O artigo em questão diz que a mídia brasileira precisa ser construída com base no interesse público e no respeito à diversidade nacional.
“A programação das emissoras de TV deveria ser fiscalizada pelo Estado, para impedir que houvesse essas humilhações”, reclama Michelle Prazeres, que também é da Intervozes. Para ela, as empresas que recebem a concessão do uso do espectro público para sinal de TV não estão acima da lei. “O programa, como um produto, está encerrado. Como um processo de mudança social, está no início”, pondera a militante.
Prazeres está correta. A ação civil que culminou com a saída de João Kleber da grade televisiva gerou mais mobilizações. Recentemente, o Ceert (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), o Intecab (Instituto Nacional de Tradição e Cultura Afro Brasileira) e o Ministério Público Federal ingressaram com uma ação civil coletiva contra a Rede Record S/A e a Rede Mulher de Televisão, com o objetivo de adquirir direito de resposta contra essas emissoras. As ONGs e o MPF acusam as duas de exibirem uma programação que deturpa as religiões de matriz africana.
Reações
No dia 11 de dezembro, os advogados da Rede Record S/A e da Rede Mulher de Televisão entraram com uma representação na Justiça Federal de São Paulo contra Sérgio Suiama. Eles acusam o Procurador da República de praticar censura” e de chamá-los de “representantes da intolerância e do ódio religioso no país”. A assessoria de imprensa da Rede Record considera que o comportamento de Suiama assumiu contornos pessoais.
Os advogados das emissoras entraram, ainda, com outra representação contra a doutora Sylvia Marlene de Castro, juíza federal substituta que presidiu a audiência pública onde supostamente ocorreu o incidente.
Para Suiama, trata-se de um embate com caráter político contra emissoras poderosas. “A Rede Record está sendo procurada para acertar um termo de conduta quanto à exibição de uma criança com câncer no programa da Sônia Abraão. O termo levará à exibição de uma resposta em quatro programas, sobre o tema dos direitos da criança e do adolescente”.
O site do programa “Direitos de Resposta” é http://www.direitosderesposta.com.br
(Por Rafael Sampaio – Carta Maior – em 20/jan)
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