A Fetraf-RJ/ES promoveu na última quarta-feira (22) um seminário para discutir estratégias para a reforma trabalhista. Três advogados com vasto conhecimento na área apontaram possíveis planos de ação para os sindicalistas e assessores jurídicos sindicais da base que compareceram ao evento.
Na parte da manhã, o advogado Nassan Ahmad Allan, que integra o coletivo jurídico da CUT Nacional, fez ponderações sobre os impactos da reforma sobre o movimento sindical. “O neoliberalismo trouxe o individualismo, que se opõe ao sentimento de coletividade, de solidariedade. Isto afeta o movimento sindical”, apontou. Com este cenário já montado há muitos anos, os índices de sindicalização vieram baixando ao longo do tempo. Mas a nova legislação traz dificuldades ainda maiores ao trabalho de organização das categorias. “Os contratos precários fragilizam o movimento sindical. Temos o teletrabalho, em que o funcionário fica isolado em sua própria casa. As empresas não são obrigadas a informar aos sindicatos nem quantos, nem quem são os empregados que trabalham desta forma. Como os sindicalistas vão chegar até estes trabalhadores?”, apontou. O trabalho intermitente – por hora – também é outro fator que dificulta, porque o trabalhador terá vários empregos e poderá pertencer a mais de uma categoria e, ao mesmo tempo, não se identificar com nenhuma. A terceirização é outro importante entrave à ação sindical, já que uma mesma empresa poderá ter terceirizados de prestadoras diferentes num mesmo local, pulverizando as categorias. Uma das saídas, é redefinir os conceitos de categoria profissional e grupo econômico, com base na cadeia produtiva da atividade. Mas a principal recomendação é pressionar. “O sucesso das ações vai depender da pressão dos trabalhadores sobre o Judiciário. O lado de lá já está pressionando. Precisamos pressionar também”, propôs.
Na parte da tarde, a conversa foi com o advogado Ivan Simões Garcia, que é professor de Direito do Trabalho da UERJ e da UFRJ e com o procurador MPT-RJ Cássio Casagrande e professor de Direito Constitucional da UFF. Ivan Garcia começou traçando um panorama dos três tempos em que começou a reforma trabalhista. O primeiro foi o desengavetamento do projeto de lei de terceirização de 1998 que acabou sendo aprovado e sancionado em maio, passando por cima da tramitação do PLS 30 – antigo PL 4330, na Câmara – que estava entravada graças à ação política feita pelos sindicatos e profissionais do Direito do Trabalho. O segundo momento foi a tramitação acelerada e atípica do projeto de reforma que resultou na lei 13.467/17, que está em vigor desde o último dia 11. E o terceiro é a Medida Provisória 808, editada pelo Planalto em 14 de novembro, que altera ou complementa itens como jornada de trabalho 12×36, trabalho insalubre da gestante ou lactante, contrato intermitente e representação sindical na negociação coletiva, entre outros. O advogado destacou que a redução das exigências para dispensa imotivada e contratos precários facilita a rotatividade. Outro alerta é que a própria existência da Justiça do Trabalho está ameaçada, já que vários parlamentares já fizeram manifestações públicas contrárias à sua necessidade. “É preciso analisar profundamente a reforma e descobrir seu sentido geral para, então, articular a reação às mudanças”, recomenda Ivan Garcia. “A lei foi sancionada, mas a história não acaba aqui”, concluiu, apontando que há caminhos para proteger o trabalhador.
O procurador Cássio Casagrande destacou que a ameaça à existência da Justiça do Trabalho é real e que é preciso elaborar estratégias para mantê-la. “A Constituição de 88 ampliou o acesso à Justiça, inclusive a do Trabalho, Dizem que o número de ações trabalhistas é muito alto, mas isto não é ruim. Pelo contrário: demonstra o aumento do acesso. Mas esta reforma está criando barreiras para que o trabalhador recorra ao Judiciário para reclamar seus direitos”, ponderou. Casagrande destacou que mesmo os beneficiários da gratuidade de Justiça terão que arcar com custos de honorários advocatícios e periciais e até custas processuais, o que é inconstitucional. Quanto aos acordos extrajudiciais, que só precisam ser homologados por juiz, sem obrigatoriedade de audiência, são um risco e é preciso que o MPT investigue estes acordos. Outro alerta é que o TST também passou a ter restrições para emitir súmulas para uniformização de jurisprudência – como foi o caso da súmula 331, de 1996, que impedia a terceirização na atividade-fim. Com isso, um risco é que cada TRT comece a ter sua linha de interpretação e se criem vários “Direitos do Trabalho” estaduais. Uma saída para os sindicatos é inverter a lógica do negociado sobre o legislado, pressionando por Convenções e Acordos Coletivos que tragam dispositivos capazes de afastar as novas regras. O procurador citou o acordo 2017/2018 do Sindicato dos Comerciários de Porto Alegre, que garantiu que demissões de trabalhador com mais de um ano de contrato sejam feitas no sindicato. “É preciso criatividade para defender o Direito do Trabalho e este é o momento de repensar a organização sindical”, recomendou.
O diretor do Departamento Jurídico da Fetraf-RJ/ES, Paulo Garcez, destacou que o evento teve um tom menos apocalíptico que outros. Ao invés de apenas ouvir as barbaridades trazidas pela reforma trabalhista, os presentes viram profissionais do Direito apontarem caminhos para enfrentá-la. “Os sindicatos vão precisar rever sua forma de atuar, capacitar os dirigentes para fazer a discussão junto aos trabalhadores e pensar novas formas de agir tanto no campo jurídico como na ação sindical diária e nas negociações coletivas”, apontou. Haverá necessidade de aperfeiçoar e aprofundar a ação sindical. “A reforma só trouxe prejuízos ao trabalhador, mas temos que intensificar nossa atuação em todas as frentes para garantir o emprego, a remuneração justa e adequada e a dignidade, saúde e segurança dos trabalhadores”, concluiu o dirigente.
Fonte: Fetraf-RJ/ES