Foto: Jailton Garcia – Contraf-CUT
Por Juliana Satie e Rodolfo Wrolli
Saúde e condições de trabalho foram os temas que iniciaram os debates da 15ª Conferência Nacional dos Bancários nesta sexta-feira 19, em São Paulo. O assunto é um dos que mais preocupa a categoria. A conferência, que se estende ao sábado e domingo, aprovará a pauta de reivindicações da categoria, a ser entregue à federação dos bancos (Fenaban).
O professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP), Wilson Amorim, apresentou conclusões prévias de uma pesquisa que busca identificar como a gestão por competências, praticada pelas empresas, afeta as relações de trabalho tanto dentro das corporações – como os bancos – como nas negociações coletivas.
A gestão por competências envolve a avaliação de características como organização, liderança, visão de negócio, trabalho em equipe, multifuncionalidade, dentre outros.
Falta integrar formação e educação
Uma das conclusões tiradas do estudo é que, no Brasil, uma política pública que integre a formação profissional ao sistema nacional de educação é ausente. Essa função, segundo Amorim, está relegada a escolas como o Sesi e o Senai – administradas pela iniciativa privada – ou a universidades corporativas.
“Ao trabalhador cabe a ideia de que ele próprio deveria se preocupar com seu desenvolvimento profissional, o que cabe no discurso da individualização do contrato de trabalho. É cada um por si e, de maneira geral, os governos e as empresas ficam distantes desse processo”, explica.
Dentro do sistema financeiro, o professor traçou um paralelo entre as décadas de 1990 e 2000. Na última década do século 20, Amorim lembra que houve uma redução drástica na quantidade de bancários, decorrente das políticas neoliberais, como as privatizações dos bancos estatais, fusões de bancos e enfraquecimento do movimento sindical, por exemplo.
Já os anos 2000 foram marcados, de acordo com Amorim, pelo aumento da renda dos trabalhadores e a retomada dos níveis de emprego. “Do ponto de vista coletivo, houve aumento do poder dos sindicatos. Se você tem elevação do número de trabalhadores, a pressão pelo salário se torna positiva e é por isso que os aumentos reais se sucederam. Não é por outra razão que houve greves desde 2002”, avalia o pesquisador.
Amorim ressaltou que nesse meio tempo o trabalho dentro dos bancos mudou, e um aspecto relevante para essa mudança é a exigência para a qualificação. “A gestão de competência baliza a carreira do bancário. Ele só vai subir de cargos dentro do banco se tiver determinadas competências adquiridas por meio de certificações, cursos, faculdades ou programas de desenvolvimento interno do banco”, diz Amorim.
Os perigos da ‘gestão por competência’
De acordo com dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), que representa as instituições que atuam no mercado de capitais brasileiro, desde 2003 foram realizados mais de 518 mil exames para certificação, como o CPA-10 – que permite aos bancários comercializar e distribuir produtos de investimento para o público investidor -, o que prova a avidez dos bancários pela formação específica e dos bancos pela gestão de competência.
O pesquisador acrescenta que algumas instituições financeiras, como o Bradesco e o Banco do Brasil, já estão se preparando para a realidade da gestão de competências com cursos para os seus funcionários. “A gestão de competências formata a carreira do indivíduo porque ela mexe no desenvolvimento, nas características que são descritas para a contratação do sujeito, e em algum momento, a empresa ainda vai fazer uma avaliação de desenvolvimento”, explica.
Para Amorim, a principal conclusão tirada do estudo é que a certificação resulta de uma negociação setorial exclusiva dos bancos e que exclui o trabalhador. “É estranho que a gestão de competência envolva meio milhão de trabalhadores, que afete o mercado de trabalho e o processo de carreira dentro das instituições financeiras e, no entanto, o movimento sindical e os trabalhadores sejam alijados das decisões que envolvam esse tema”, conclui o pesquisador.
Adoecimentos
O psicólogo Roberto Heloani, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), falou sobre o adoecimento da categoria, uma consequência do assédio moral e do isolamento do trabalhador, causado pelas novas formas de trabalho.
Heloani abordou vídeo do Sindicato dos Bancários da Paraíba, exibido antes do debate, e que traz o depoimento de uma funcionária do Banco do Brasil, demitida depois de 26 anos de dedicação à empresa. “A pessoa sacrifica sua vida pessoal, seus entes queridos por amor à empresa e se sente traída quando não vê o reconhecimento do seu trabalho. A traição é uma das formas mais efetivas de sofrimento e causa adoecimento, como a depressão”, explicou o psicólogo.
Segundo ele, a demissão de um funcionário dedicado causa medo a todos na empresa e transforma o ambiente de trabalho em um local ideal para a prática do assédio moral, já que todos sentem que podem ser os próximos desligados. “É dever do empregador cuidar do bem- estar de seus colaboradores, mas para os bancos é comum banalizar algumas práticas abusivas, com insultos, processos de avaliação sem critérios, além disso, vale qualquer coisa para atingir a meta”, criticou.
Heloani também denunciou o alto índice de suicídios de bancários e alertou para os perigos causados pelas novas formas de trabalho e as novas tecnologias, que deixam as pessoas isoladas. “Cada vez mais o trabalho é feito de forma burocratizada e impessoal, o que deixa as pessoas cada vez mais sozinhas e propícias a doenças psíquicas.”
Ele explicou que quando as pessoas estão em grupo, têm ‘proteção psíquica’, pois ao sinal de ameaças de alguma crise depressiva, o grupo ‘abraça’. “A prática isolacionista aos poucos faz com que as pessoas se vejam como inimigos e contamina todas as relações, inclusive as pessoais.”
Fonte: Rede de Comunicação dos Bancários