O crescimento da inadimplência surpreendeu os grandes bancos de varejo no primeiro trimestre. Mas, apoiados em confortáveis colchões de reservas e polpudas receitas do crédito de varejo, os bancos mantiveram lucros crescentes.
Bradesco, Itaú e Unibanco tiveram lucro líquido consolidado de R$ 3,51 bilhões no primeiro trimestre, 27,8% superior ao de R$ 2,748 bilhões de igual período em 2005, de acordo com levantamento da Austin Rating. O retorno médio desse grupo seleto, calculado sobre o patrimônio líquido do final de março, subiu de 27,8% em 2005 para 30,2% neste ano.
Uma das principais fontes de receita dos três bancos foi o crédito, que cresceu 25,3% sobre março de 2005, para R$ 188,079 bilhões.
Nem o resultado nem a carteira de crédito foram afetados pelo aumento da inadimplência. O levantamento da Austin Rating , mostra que a inadimplência, calculada pela relação entre o volume de créditos em atraso há mais de 60 dias e o total da carteira dos três bancos cresceu de 2,4% para 2,8%. Além disso, os bancos mantiveram os elevados níveis de provisões, equivalentes a 6,3% da carteira.
O presidente da Austin Rating, Erivelto Rodrigues, afirmou que a inadimplência aumentou nos balanços dos grandes bancos por causa da mudança de mix das carteiras. De fato, as operações de financiamento ao consumo saltaram nos bancos nos últimos meses.
No Unibanco, que divulgou ontem o balanço, o crédito cresceu 19,6% entre março de 2005 e março passado. Só as operações de varejo aumentaram 25,4% e passaram a representar 57% da carteira em comparação com 55% um ano antes.
No entanto, as operações de varejo, lembrou Rodrigues, são as que dão maior retorno. Por isso, os bancos puderam reforçar as provisões e ainda aumentar o lucro. “O risco é maior, mas a margem é maior”, concluiu. Para o analista, as provisões são suficientes para suportar até o dobro da inadimplência atual.
Para o Bradesco e o Itaú, o aumento da inadimplência no primeiro trimestre foi apenas sazonal. Já o Unibanco detectava sinais de deterioração desde o final do ano passado. Uma possível explicação para essa diferença de avaliação é a idade das carteiras. Operações mais novas como as do Bradesco e do Itaú levam algum tempo para registrar problemas.
Para o presidente do Bradesco, Márcio Cypriano, a inadimplência do primeiro trimestre ficou “acima do esperado”, mas teria tido causas sazonais como o acúmulo de compromissos das pessoas no período, com pagamento de IPTU, IPVA e escola. A reação do Bradesco foi redobrar a cautela. As despesas com provisões cresceram 47,8%. O saldo das provisões atingiu R$ 5,3 bilhões, equivalente a 6,3% da carteira de crédito, sendo R$ 1 bilhão acima do mínimo exigido pelo Banco Central (BC).
O vice-presidente do Bradesco, Milton Vargas, afirmou que as despesas com provisões cresceram em função da mudança de perfil da carteira. Da carteira de crédito de R$ 84,426 bilhões do Bradesco, 42% são operações de pessoas físicas; um ano antes, 36%.
Já o Itaú, que está imprimindo um agressivo ritmo de crescimento no financiamento ao consumo, as despesas com provisões saltaram 90,58%. O saldo das provisões atingiu R$ 4,7 bilhões, dos quais R$ 1,5 bilhão acima do exigido. O índice de cobertura do Itaú é o maior entre os três bancos: as provisões equivalem a 7,3% da carteira. A precaução tem motivos: segundo o diretor Silvio de Carvalho, as operações vencidas há mais de 60 dias representavam 4%, atingindo 25% nos créditos da financeira Taií.
O vice-presidente corporativo do Unibanco, Geraldo Travaglia, afirmou que o banco verificou o aumento da inadimplência já no último trimestre de 2005. A constatação levou o banco a reforçar mais as provisões e a ser mais seletivo na concessão de crédito.
Essa última política, disse, explicou o fato de o Unibanco ter aumentado a carteira de crédito menos do que os outros grandes do varejo. A carteira do Unibanco cresceu 19,51% para R$ 39,648 bilhões, de março de 2005 para março passado. A ênfase foi dada em linhas de menor risco, acrescentou. A carteira de cartão de crédito, por exemplo, cresceu 51,6%; e a de pequenas e médias empresas, 25,1%.
No Unibanco, a inadimplência nas operações de financiamento ao consumo chegou a 10,1% em março, em comparação com 8% um ano. Mas cai para 4% em veículos (3,6% um ano antes).
Para Travaglia, o mercado está “sofrendo pelo excesso de oferta de crédito e pela ausência de um birô positivo de crédito”. Mas acredita que o mercado vai voltar a um padrão normal. A falta de um birô de crédito já havia sido apontada nesta semana pelo novo presidente do Credicard Citi, Hector Nevarez, como um dos motivos da manutenção dos juros altos do crédito.
Fonte: Valor Econômico