O economista Cloviomar Cararine, supervisor técnico do Dieese-RJ, esteve na 13ª Conferência Interestadual dos Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo e apresentou uma análise de conjuntura. O objetivo da exposição é informar os bancários sobre o panorama em que vai se desenrolar a campanha salarial, para embasar as reivindicações. Após sua fala, Cararine conversou com a reportagem.
Os bancários são uma das categorias mais importantes que negociam no segundo semestre, ao lado dos petroleiros e dos metalúrgicos do ABC, que também têm data-base em 1º de setembro. Mas o Dieese analisa as negociações de muitas categorias e os resultados destes acordos servem de base para outros. “Olhando para as categorias que já fizeram sua campanha salarial, verificamos que a pauta de reivindicações da maioria é sempre a partir do reajuste que tiveram no ano passado. Como cerca de 97 % tiveram aumento real, este ganho ficou como referência para este ano. A maioria dos ganhos reais ficaram na faixa até 2 % , mas houve 15 % das categorias com aumento real que tiveram ganhos acima de 3 % ”, adianta Cloviomar. O economista também destaca que tem havido uma tendência de unificação das pautas de categorias que fazem negociações regionais ou por empresa. “Estamos vendo uma nova fase, um experimento de tentar criar um índice só para todo mundo. E aí, uma categoria ou um sindicato começa a pautar os outros”, informa.
Mas Cloviomar já identifica um “recado” que vem sendo dado pelo governo de não estimular reajustes altos para as categorias fortes de setembro. “Primeiro, acho, por causa do reajuste do salário-mínimo, em janeiro de 2012, que deve ser de 13 % . Outra leitura que se faz é, ainda, de que salário cria inflação. Sabemos que isso não é verdade, mas é tudo uma disputa”, avalia.
Outros parâmetros
Para o economista, a mentalidade de que salário gera inflação vem mudando muito em função da atuação dos sindicalistas, que não a aceitam mais e a vêm combatendo. “O movimento sindical entendeu e comprou essa ideia e tirou isso da pauta, parou de brigar por esta questão”, analisa. Mas o economista também lembra que a memória das altas taxas inflacionárias ainda é recente e influencia o pensamento. “A inflação está estabilizada praticamente desde 1994, quando foi lançado o Plano Real, e a inflação ainda não saiu do centro da meta. Mas se tem uma cultura da inflação e o próprio movimento sindical tem essa cultura e é preciso rompê-la”, analisa Cloviomar. Cloviomar destaca que uma das dificuldades das negociações é que os trabalhadores olham para trás, considerando as perdas, enquanto que os empresários olham para frente, pensando no quanto os reajustes vão onerar seus custos.
O economista entende que é possível discutir os reajustes com base em outros parâmetros, como produtividade do trabalho, os lucros que aquele trabalho gera e mudanças no volume de trabalho. A referência da inflação é geral, para a categoria toda, e as outras podem ser referencias específicas para aquela categoria ou região. O técnico do Dieese informa, por exemplo, que algumas categorias do estado do Rio de Janeiro estão usando a variação do índice regional de custo de vida para reivindicar seus reajustes. Já os bancários, que têm negociação nacional – e também pelo porte da categoria e importância política de sua representação sindical – podem usar, por exemplo, a participação do setor financeiro no PIB (veja gráfico). Além do crescimento puro e simples, o PIB bancário reflete o crescimento da economia, já que há mais dinheiro passando pelos bancos – e, em consequência, o volume de trabalho dos bancários também cresce.
Mercado de trabalho x remuneração
Outro ponto abordado pelo economista em sua exposição diz respeito ao nível de emprego e à remuneração. O mercado de trabalho bancário voltou a crescer desde que atingiu o patamar de pouco mais de 393 mil bancários em 2001. Mas as estatísticas mostram que a massa salarial média não teve aumento compatível com os reajustes da categoria no período, o que demonstra claramente que está havendo substituição de trabalhadores mais antigos por novos bancários, com remuneração inferior. Quanto à questão das fusões no setor bancário, que estão gerando demissões, Cloviomar aponta que há, sim, dispensas provocadas pela redundância, ou seja, a nova empresa passa a ter mais trabalhadores do que cargos. Mas o economista também pondera que a situação mais comum é a companhia aproveitar a fusão para enxugar a folha de pagamento. Cloviomar sugere que os sindicatos façam um trabalho de identificar a necessidade de trabalhadores por local de trabalho, com base no porte e no volume de trabalho de determinada agência ou departamento para, então, poder combater as demissões.
O economista defende que a produtividade e a lucratividade não são refletidas pelo valor de PLR pago pelos bancos. O que reflete estes indicadores é a meta definida pelos bancos. O que acontece é que a produtividade é definida antes de ser realizada, mas a remuneração por ela não acompanha o ritmo de crescimento das metas. “A intensificação do trabalho não está voltando para o trabalhador como salário, mas como gratificação – os programas próprios de remuneração variável.
Mesmo considerando todos os aspectos conjunturais, o economista ressalta que o mais importante fator que define o sucesso de uma campanha salarial não pode ser medido em números. “Tem tudo a ver com a capacidade de mobilização. Pode-se escolher a melhor referencia possível, mas se não conseguir mobilizar a categoria, vai ganhar reposição da inflação e mais nada, se conseguir ganhar a inflação. Cloviomar ressalta, ainda, que é preciso escolher uma referência que tenha vínculo com a relação do trabalho. “Sempre alertando que em período de baixa inflação, estabilidade de preços, é hora de discutir outras questões. “É possível, por exemplo, usar custos que estão fora da média. Trouxemos, na nossa exposição, a variação do custo de alimentação fora do domicílio, que aumentou muito, e pode ser uma referência para discutir o tíquete-refeição. Portanto, pode ser interessante negociar índices diferentes para salário e para benefícios”, exemplifica o técnico. Cloviomar dá o exemplo dos petroleiros, que costumam adotar esta estratégia para o tíquete-refeição e para o auxilio-educação.
Perigo lá fora
O detalhe difícil para as campanhas salariais do Brasil é a crise na Europa, já que os países do continente são grandes consumidores de produtos brasileiros. Com a redução do consumo pelos europeus, as exportações caem e influem no desempenho geral da economia. Com relação aos bancos, a questão também é severa, já que temos no Brasil bancos estrangeiros que vão usar os resultados do Brasil para compensar as perdas nos outros países, e isso ainda pode gerar ainda mais pressão por produtividade sobre os bancários brasileiros. “A crise não passou, ainda há muita coisa em disputa, alerta Cloviomar.
Mesmo com a crise internacional, é preciso olhar para a economia brasileira. ”Não temos mais o chamado “vôo da galinha”, que voa um pouquinho e cai, e voa novamente e torna a cair. Agora há uma certa estabilidade e estamos mudando de patamar. O Brasil vai se tornar uma potência. Agora a grande questão é distribuir a renda”, conclui o economista.
Fonte: Da Redação – FEEB-RJ/ES