Em seminário, BC diz que há no país cerca de 90 mil postos, mas só 46 mil são reconhecidos
Em seminário realizado nesta quarta-feira, dia 29, na Fecomércio, o Banco Central informou que já existem no país cerca de 90 mil pontos de correspondentes bancários. Oficialmente, o BC reconhece a existência de pouco mais de 46 mil pontos, mas admite que não tem verba suficiente para acompanhar o setor.
O serviço, autorizado pelo Banco Central desde 1979, surgiu efetivamente a partir de 1999, com o objetivo de levar a bancarização aos rincões do Brasil onde os cidadãos não contavam com serviços bancários disponíveis. De lá para cá, a proposta inicial vem sendo descaracterizada: dos 90 mil pontos existentes, cerca de 60 mil estão na região Sudeste, 38 mil na cidade de São Paulo e muitos deles funcionam em regiões centrais onde existem muitas agências bancárias.
Os correspondentes bancários acabaram se transformando num meio encontrado pelos bancos para baratear seus custos: eles aumentam seus lucros e jogam a conta para a sociedade. Ao longo dos últimos anos, o sistema financeiro expulsou a população das agências, por meio da informatização, das enormes filas, da falta de pessoal para o atendimento. Foi gerado o ambiente propício para a criação de locais onde pagar contas e ter acesso ao crédito fosse mais fácil.
Os números confirmam esse ponto de vista. Desde o ano 2000, o número de pontos de correspondentes bancários passou de 63 mil para 90 mil. No mesmo período, o de agências saltou de 16.396 para 17.515. O setor, que em 2000 movimentava R$ 22 milhões em cerca de 63 mil operações, chegou a 2005 responsável por 1,4 bi operações que somam mais de R$ 27,5 bilhões.
Os correspondentes, portanto, têm hoje um papel fundamental na sociedade. Assumiram uma prestação de serviço que os bancos não querem fazer e que hoje, conforme o próprio setor avisa, já não podem absorver. O que o movimento sindical reivindica é que se criem regras e limites que evitem a já crescente precarização na qualidade do atendimento à população e a flexibilização dos direitos trabalhistas desse exército de profissionais que atuam nos 90 mil pontos de atendimento e que nem o Banco Central sabe dizer quantos são.
Aponta-se para uma tendência de estagnação no número de agências e um crescimento acelerado no número de pontos de correspondentes bancários. Para o comércio é bom, atrai clientela. Para a população também é mais fácil que ir ao banco, mas questões como segurança, direitos do consumidor e direitos trabalhistas estão sendo deixadas de lado. O movimento sindical, portanto, já entregou dossiê sobre o tema para a Secretaria Geral da Presidência da República e ao Ministério do Trabalho e Emprego, sugerindo a devida regulamentação para o setor. Temos que estar atentos à criação de um sistema que pode representar grave risco para a sociedade e para esses trabalhadores correspondentes que estão ligados ao sistema financeiro, mas não têm qualquer representação efetiva!
Bancos distorcem uso de correspondentes bancários
Os correspondentes bancários levaram o serviço bancário para municípios brasileiros em que até o final dos anos de 1990 não contavam sequer com uma agência de banco. Esse feito abriu caminhos para que muitos brasileiros pudessem pagar por serviços, adquiridos, receber benefícios de programas de governo e ter acesso a crédito, a famosa “bancarização”.
“Objetivo é levar a atividade bancária para a população. No final da década de 90, dos 5.600 municípios brasileiros, 1.700 (4 milhões de pessoas) não possuíam agência bancária, dificultando a assistência de crédito – fator gerador de desenvolvimento”, destaca Luiz Edson Feltrim, diretor do Banco Central.
Inicialmente o BC autorizava a abertura de postos de correspondentes bancários apenas em cidades que não possuíam agências bancárias, em 2000, a instalação foi permitida para todas as localidades e tomaram as periferia e o centro das grandes cidades.
A partir de então os bancos encontraram uma brecha para se livrar da legislação trabalhista e de segurança prevista na abertura de agências e partiram para instalação de correspondentes bancários. Com isso, o número desses tipos de pontos, salto de 63 mil em 2000 para 90 mil em 2005, enquanto a quantidade de agências bancárias permaneceu praticamente estável, passaram de 16.396 para 17.515. No mesmo período a movimentação financeira passou de R$ 22 milhões para R$ 22 bilhões.
O negócio tem dado tão certo que, a Lemon Bank, empresa que entrou nesse mercado em 2002, possui uma agência bancária e pretende alcançar ainda este ano a marca de cinco mil pontos de correspondentes bancários instalados. Empresários e a direção do banco central são categóricos em dizer que a redução de custos foi fundamental pela expansão do negócio.
Não dá para avaliar a economia total com a nova modalidade de serviço bancário, mas com certeza a redução é fortemente percebida nos gastos com funcionários. Para ter uma idéia o piso salarial de um caixa de banco é de R$ 1.107, enquanto nas lotéricas, por exemplo, o piso de um funcionário para este mesmo serviço fica em torno de R$ 446, lembrando que mesmo inferior ao pago na categoria bancária, quem arca com os custos são os donos de lotéricas. Essa diferença salarial para função semelhante se repete em todos os estabelecimentos comerciais que possuem serviço de correspondentes bancários.
Luiz Edson Feltrim, diretor do Banco Central, diz que as questões de segurança bancária e legislação trabalhista não são de competência da instituição, que trabalha para viabilizar o acesso da população às agências.
Correspondente bancário: uma facilidade, não uma obrigação
Órgãos de defesa do consumidor reconhecem função social dos correspondentes bancários, mas criticam precarização no atendimento e na segurança O atendimento oferecido por correspondentes bancários deve ser tratado com uma opção de serviço e não uma obrigação aos clientes que desejam pagar suas contas. Esta é avaliação do Procon, órgão de defesa consumidor.
Os correspondentes bancários foram inicialmente criados para atender à população sem acesso às agências bancárias, que em sua maioria é de baixa renda, mas logo se espalharam para os grandes centros comerciais e chegam hoje a 90 mil pontos em todo os país, 38 mil apenas no estado de São Paulo.
O movimento sindical recebe denúncias de que alguns bancos orientam os clientes a realizar operações consideradas simples, como pagamentos de contas de consumo, apenas em correspondentes, com o objetivo de tirar parte da população das agências bancárias, o que caracterizaria uma ação discriminatória.
O Procon orienta aos clientes que se sentirem discriminados a exigir seus direitos de cidadão, processar o banco e cobrar indenização por danos morais. A pessoa nessas condições poderá entrar em contato com o Procon, o órgão abrirá um processo administrativo contra o banco que, caso comprovada a prática ilegal, poderá pagar multa que vai de 200 a 3.000 UFIRs.
Visão semelhante tem o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), que assim como o Procon valoriza a ampliação do atendimento bancário, a famosa bancarização, mas revela preocupação com a precarização no serviço que já vem de longo tempo, quando se intensificou a informatização nas agências.
Para Marcos Guedes, advogado e gerente jurídico do Idec, a tentativa de afastar os clientes das agências é uma prática constante dos bancos, assistida inicialmente com a informatização dos serviços, o que levou o BC a lançar uma norma de que o banco não poderia se negar a atender os clientes que preferem ser tratados por caixas “humanos”.
O atendimento por meio dos correspondentes, além do barateamento dos custos, ainda traz outro atrativo para os banqueiros: essa modalidade está fora da legislação de segurança e da dos 15 minutos. Também representa um abuso da terceirização, já que os bancos vivem da exploração dos trabalhadores dos estabelecimentos comercias, que nos caso das lotéricas chegam a ganhar em média três vezes menos do que um bancário.
O Procon defende ainda a extensão da aplicação da lei dos 15 minutos em agências bancárias para correspondentes bancários: lotéricas, correios, supermercados e todos os estabelecimentos que prestam esse tipo de serviço. “Há a necessidade do legislador municipal estudar a abrangência da Lei”, avalia diretora do Procon Marli Aparecida Sampaio, considerando que esses estabelecimentos oferecem os mesmo tipo de serviço que as agências bancárias.
Fonte: Valor Econômico